Esses dias um ex-aluno da DJBan enviou um e-mail para nós perguntando se poderia postar no site dele um set com músicas de outros produtores. Esse e-mail nos deu a idéia de um post que falasse especificamente sobre direitos autorais, algo que a maioria dos DJs desconhece.

Hoje já é comum ouvirmos de qualquer DJ, experiente ou novato, que para seguir na carreira e obter sucesso é preciso que este seja também produtor. Isso fez com que profissionais que estavam de um lado da história passassem para o outro, enxergando agora pelo ângulo do autor, não apenas do executor.

DJs que nunca viram problema em lotar o HD com músicas baixadas gratuitamente para tocar na balada, agora ficam furiosos se encontram suas produções em sites como 4Shared, ao mesmo tempo em que os downloads legais não decolam. E eles já começam a pensar se não deveriam ganhar alguma coisa pelas músicas que recheiam os cases dos DJs mundo afora e geram grandes lucros nas baladas.

O que diz a lei?

A lei de número 9610, assinada em 1998 pelo então presidente FHC, trata da questão dos direitos autorais e pode ser lida na íntegra aqui (acredito que vale a pena). Simplificando um pouco os 115 artigos, o que temos é:

–       A proteção aos direitos do autor* independe de registro (interessante no nosso caso, pois muitas músicas sem registro são publicadas em redes sociais e afins).

–       Depende de aprovação do autor a reprodução e edição da obra (sets, remixes) e é direito do autor ter seu nome em qualquer reprodução de sua obra, seja original ou versão editada.

–       A reprodução de obra em locais de freqüência coletiva (como baladas) só é permitida mediante autorização do autor.

–       O comprador de um obra não tem direitos sobre ela (ou seja, mesmo baixando legalmente uma música).

Poderia preencher a página com parágrafos que interessariam a todos os DJs e artistas em geral, mas vamos nos ater ao que foi exposto. Por lei não podemos criar sets, não podemos criar remixes da Lady Gaga (só pra citar um exemplo bem popular) e muito menos podemos ganhar dinheiro tocando por aí músicas que não são nossas.

E agora?

Agora eu digo o óbvio: Ao criar e sancionar a lei, ninguém pensou nos DJs e muito menos que ser DJ constitui uma profissão. E olha que a lei é de 1998, quando remixes e afins já faziam parte da cultura musical brasileira há um bom tempo (20 anos, pelo menos?).

Hoje muitas vezes não é possível dizermos o que é uma obra original porque em música eletrônica, por exemplo, há faixas construídas inteiramente por samples, trechos de outras músicas, remix do remix, cópia da cópia… Além disso, muitas vezes remixes impulsionam as versões originais e ai ninguém reclama de direito autoral. A lei não está atualizada com a realidade, aliás, já não estava quando foi aprovada.

Em que século está o ECAD?

O ECAD é o órgão responsável por recolher e repassar os direitos autorais de tudo o que é reproduzido no Brasil. Alguém acha que isso é possível? Fiscalizar a programação diária de todas as rádios, TVs, bares, lojas, baladas e, agora, até a internet… O ECAD faz uma fiscalização esporádica e muito longe do que realmente poderia ser recolhido de direitos autorais.Recentemente estive com um representante de uma das sociedades que formam e administram o ECAD. Duas coisas me chamaram a atenção na conversa:

– O representante me disse que em festas de grande porte sempre há fiscalização do ECAD, que o dinheiro da reprodução das músicas é sempre recolhido mas que, por não haver uma relação prévia das músicas que serão tocadas, esse dinheiro nunca chega nos produtores.

Pois bem, imagine todos os DJs de um festival fazendo uma relação prévia das músicas que serão tocadas, ignorando aquilo que é a grande virtude de um DJ, o feeling, e ignorando a construção do set de acordo com o que pede o momento. Imaginou? Ok, vamos ao segundo fato.

– Na mesma conversa o profissional me revelou que ficara sabendo recentemente que DJs agora faziam suas próprias músicas e não apenas remixes…

Depois de ouvir essas duas declarações eu comecei a pensar qual era realmente a distância entre a lei, a fiscalização (ECAD) e o mercado da música eletrônica (baladas, produtores e DJs). E também para onde vai esse dinheiro recolhido das grandes festas (é muito mais do que você imagina). Portanto, se ninguém até o momento pode nos ajudar, porque não um pouco de…

Bom senso!

Se você é DJ, ganha dinheiro com isso e se considera um profissional, há algumas coisas que pode fazer para ajudar outros profissionais e a cena de uma forma geral:

–       Não toque com músicas baixadas ilegalmente, você estará prejudicando um colega que fez com que o seu trabalho fosse possível.

–       Ao disponibilizar um set para audição e às vezes download, tenha o cuidado de descrever todas as músicas e seus produtores. Colocar links para esses produtores também não é má idéia (não o link do 4Shared!)

–       Se você fez um remix e pretende vendê-lo, procure o produtor da música original. Se não irá comercializar, ao menos identifique o nome do produtor.

–       Informe-se sobre o que está acontecendo na cena. O que acha da regulamentação da profissão de DJ? Conhece o sindicato? Conhece comunidades onde os produtores permitem o download gratuito de suas músicas?

Para finalizar, dois casos recentes que merecem reflexão. O primeiro é sobre um DJ que foi preso acusado de tocar com músicas piratas, mas que afirmava baixar suas músicas legalmente. Ele deveria guardar consigo comprovantes de compra de cada música? E se ele gravasse um CD com essas músicas? Aliás, leia o artigo 184 do Código Penal e informe-se sobre violação do direito autoral.

O segundo caso é uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que causou polêmica. O ECAD autuou o conhecido club Anzu, em Itú, por não pagar direitos autorais das músicas tocadas na balada. O TJ-SP entendeu que isso não constituía crime e o caso foi visto como um marco que poderia influenciar decisões futuras em situações semelhantes.

Deixaremos para um outro post questões como a reprodutibilidade musical na internet, uso de samples, música gratuita e seu uso apenas como forma de divulgação do autor (como acontece com o Calypso).

* Na maioria das vezes o titular dos direitos da obra não é o autor, mas uma gravadora, selo, produtor ou editora. A lei vale da mesma forma nesses casos e há um parágrafo que trata inteiramente da exploração dos direitos autorais.

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